Tem certas coisas que fazem tanta parte do nosso cotidiano que é difícil pararmos para refletir sobre por que elas estão ali. É o caso da camiseta: básica, a t-shirt segue o que parece ser o corte de roupa mais natural para o corpo humano: uma abertura redonda para o pescoço, duas mangas curtas, e nada muito além disso. Porém, não precisa ser nenhum especialista em história da moda para saber que nem sempre a humanidade se vestiu assim.
Também não é preciso ser nenhum especialista em cinema para lembrar dos ícones que entraram na memória coletiva justamente tendo a simplicidade da camiseta como figurino: Marlon Brando e James Dean, por exemplo, contaram com a ajuda da t-shirt branca para criar a imagem do homem contestador e irresistível. Já rebeldes da vida real, como Che Guevara, acabaram virando clichê justamente ao terem o rosto transformado em estampa de camiseta.
Dá para ver, portanto, que falar em camiseta é falar do século XX. A peça surgiu, é bem verdade, a partir das roupas de baixo do século XIX, mas foi apenas no período seguinte que ganhou status de peça-chave. A sua origem é normalmente relacionada com a Guerra Hispano-Americana. Foi durante o conflito que marinheiros americanos passaram a receber camisas sem botão como parte do uniforme.
História da T-shirt
Confortável e com baixo custo de fabricação, a t-shirt não demorou a ser incorporada em outras ocupações que demandavam trabalho corporal, como na agricultura. E alguns dos maiores desafios do século XX empurraram mais ainda a sua popularização, como a Grande Depressão e a Segunda Guerra Mundial.
Vista antes de tudo como necessária entre a classe trabalhadora, a camiseta alcançou status fashion justamente com Marlon Brando e James Dean, nos anos 50. Vestida por astros do cinema, ela não demorou a ser eleita pela juventude como item do guarda-roupa que garantia a casualidade almejada pela geração do pós-guerra.
Até então fabricada em sua forma mais básica, branca ou listrada, a t-shirt passa a ficar mais ousada a partir dos anos 60: é quando ela vai passar a ser usada também para transmitir mensagens, função que desempenha até hoje. Os tempos psicodélicos também viram a popularização do tie-dye, antiga técnica de tingimento que logo foi parar nas camisetas dos mais ripongos.
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A cultura do hip hop também deu seu toque à t-shirt: no gosto dos rappers, elas ficaram mais longas, indo até os joelhos e explorando ao máximo a logomania. Já entre os roqueiros, ela já é mais do que clássica em sua versão preta, com a banda favorita na frente (falando em camisetas de rock, uma das nossas favoritas é a que homenageia Unknown Pleasures, disco do Joy Division). Assim, se há discordâncias entre ritmos de música, opiniões políticas, times de futebol ou até religião, uma coisa é certa: existe uma camiseta para expressar isso.
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Usada por praticamente todo mundo, a t-shirt poderia tranquilamente parecer sinônimo de tédio em 2017. Mas a moda tem encontrado mais de um jeito de reiventá-la: na Vetements, Demna Gvasalia bagunçou os códigos entre o high fashion e o banal ao transformar uma camiseta da transportadora DHL em ícone fashion — e com isso, fez um dos executivos da empresa achar cool trocar o terno pelo uniforme dos seus funcionários.
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O estilista Alessandro Michele, por sua vez, tem usado as camisetas da Gucci para brincar com as noções entre falso e verdadeiro, inserindo rabiscos e imperfeições em peças cobiçadas que costumam gerar cópias “perfeitas” no mercado clandestino. Enquanto isso, Maria Grazia Churi, da Dior, aproveita as camisetas para evidenciar a sua intenção de recriar a Dior como grife feminista.
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Tudo prova, portanto, que mesmo sem mudar de formato, a t-shirt ainda vai ter o que dizer por muito tempo.