Joy Division e a capa do disco Unknown Pleasures

Unknown pleasures

Capa do disco ‘Unknown pleasures’, da banda britânica Joy Division

Olhe bem para a imagem acima. O que ela te faz sentir? Curiosidade? Medo? Solidão? Ou tudo isso ao mesmo tempo? Como toda boa arte, a capa do disco Unknown pleasures, da banda britânica Joy Division, é conhecida mundialmente por ser capaz de instigar a nossa atenção com apenas algumas linhas desenhadas em fundo negro. E se, sem explicação, a imagem já é interessante, conhecendo o disco e a história da banda, uma das mais famosas do pós-punk, ela fica mais ainda.

Se você quiser ter uma sensação mais completa na leitura desse post, entender os sentimentos que cercavam os sentimentos que vamos descrever durante o texto, escute junto o álbum Unknown Pleasures:

A história do Joy Division

Em 1976, o punk estava no auge na Inglaterra. Formados um ano antes, os Sex Pistols rodavam o país com o seu som e estilo anárquicos e davam um novo sentido ao que significava ser uma banda de rock. Foi num desses shows dos Pistols que dois garotos, o guitarrista e tecladista Bernard Sumner e o baixista Peter Hook se conheceram. A cidade era Manchester, lugar que ainda veria muitas bandas lendárias nascerem.

Joy Division

Na busca por um vocalista, Sumner e Hook encontraram o melancólico Ian Curtis. No ano seguinte, após alguma dificuldade, a banda escolheu Stephen Morris para o posto de vocalista. O quarteto decidiu chamar-se Warsaw. Mas, diante da existência de uma outra banda chamada Warsaw Pakt, trocaram o nome para Joy Division. A origem do nome é assustadora: vem do livro House of dolls, de 1955, que usava o termo para se referir a uma ala do campo de concentração nazista onde as prisioneiras eram usadas como escravas sexuais.

‘Unknown pleasures’ e o pós-punk

O Joy Division conseguiu lançar o seu primeiro álbum em 1979. Limitado a 10 mil cópias, o disco iria se tornar um dos marcos do pós-punk, movimento que deu direção ao rock após as experimentações do progressivo e a rebeldia do punk. Com sua sonoridade opaca e sombria, Unknown pleasures trouxe um outro tipo de profundidade ao gênero musical. Nas palavras do crítico muscial Ned Raggett:

… as dez músicas dentro (do disco) são, simplesmente, marcos históricos frios como pedra, todo o álbum é um monumento à paixão, à energia e ao desespero catártico.

A mensagem poderosa e a preferência por uma sonoridade simples (porém nada medíocre) eram os pontos de encontro do Joy Division com o punk. Porém, assim como outras bandas da época, o quarteto se distanciava de tal movimento por apresentar uma visão menos barulhenta e mais intelecualizada. Essa mesma abordagem foi identificada em outras bandas contemporâneas do Joy Division, como Siouxsie and the Banshees, The Fall e The Cure. Tais bandas, por isso, costumam ser identificadas com o rótulo de pós-punk.

A arte da capa de Unknown pleasures

Assim como o disco, a arte na capa de Unknown pleasures tornou-se icônica com o passar do tempo. O autor dela foi o designer gráfico Peter Saville, um dos diretores da gravadora do Joy Division, a Factory Records. As linhas misteriosas, que mais parecem montanhas, são na verdade ondas de rádio emitidas pelo pulsar CP 1919. A imagem foi tirada de uma enciclopédia de astronomia, mas Saville optou por inverter as cores para o disco, usando as linhas em branco sobre um grande fundo negro. A solução minimalista é praticamente a tradução visual do som do Joy Division, misterioso, sombrio e impactante ao mesmo tempo, conforme observou a crítica Susie Goldring:

A capa bicolor de Peter Saville para o primeiro álbum do Joy Division diz muito. Suas linhas brancas no preto refletem uma pulsação de poder, uma vibração de baixo e angústia crua.

A história trágica de Ian Curtis

Toda essa angústia ao qual Unknown pleasures faz alusão, evidentemente, vinha de algum lugar. O fato é que, por trás da beleza do disco, estava um jovem artista no limite. Dono de uma voz de barítono, Ian desde cedo conciliava o seu interesse por poesia e literatura com a adoração a astros como David Bowie e Jim Morrison. Ainda aos 19 anos, ele se casou com sua namorada da adolescência, Deborah. Os dois tiveram uma filha, Natalie, em 1979.

A saúde mental de Ian Curtis, no entanto, começou a ruir no momento em que suas aspirações artísticas começavam a lhe render frutos. Ainda em 1978, antes do lançamento de Unknown pleasures, o músico começou a sofrer com ataques epiléticos. O caso era severo, e a pressão para se apresentar em shows só fez os ataques aumentarem em intensidade e frequência. A doença ainda chegou a impedir que Ian pudesse pegar sua filha recém-nascida nos braços, sob o risco de que um eventual ataque colocasse a bebê em risco.

Ian Curtis

Enquanto (e por tudo) isso, o casamento de Ian e Deborah se deteriorava. O músico, além do mais, estava apaixonado por uma outra mulher, a jornalista belga Annik Honoré. A história é contada em detalhes no filme Control (2007), de Anton Corbijn. Atormentado pela culpa e por sua doença, o inglês cometeu suicídio em 1980. Ele tinha 23 anos.

O renascimento com o New Order

A morte trágica de um talento inestimável como o de Ian Curtis poderia ser o fim da linha para qualquer outra banda. No entanto, os integrantes do Joy Division — que estavam prestes a embarcar em uma turnê nos Estados Unidos quando o vocalista morreu — conseguiram encontrar forças para manter a sua arte de pé. Surgia, assim, uma nova banda: o New Order.

New Order

Com Bernard Sumner agora nos vocais, o New Order foi muito além do que dar continuidade ao som do Joy Division. Dentro do espírito da nova década que começava, os anos 80, os integrantes da banda rapidamente souberam mesclar as suas origens pós-punk com os ritmos da nova cena eletrônica que surgia. Um encontro, portanto, da melancolia roqueira com a celebração à vida que acontecia nas boates da época.  

Do desolação à euforia, a história do Joy Division e do New Order diz muito não só sobre tudo o que é a música é capaz de transmitir, e dos caminhos tortuosos que nos levam à beleza artística. Foi esse tipo de estranhamento em relação ao próprios sentimentos que pautou boa parte do mood dos anos 80, pelo menos no rock, conforme demonstra mais um dos clássicos da época, “Happy House”, de Siouxsie And The Banshees, perfeito para garantir um happy ending ao nosso post.

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